Ubes – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas

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#VemCONUBES: Funk e política, o que tem a ver?

Bruno Ramos é um artista que desmente a ideia do funk apenas como uma cultura alienante. Vice-presidente da Liga do Funk, ele também é membro do Conselho Nacional da Juventude e vê com entusiasmo a cultura da periferia e dos jovens: “Criminalizar o funk é criminalizar o jovem preto, pobre e da periferia”.

Na última vez em que participou de um encontro da UBES, parecia que o espaço ficava pequeno para ele (foto acima). Ele empolgou os secundas e saiu cercado do 16º CONEG. Para o 42º Congresso da UBES, promete a mesma empolgação e muito papo reto. Bruno participa do lançamento do Circuito de Cultura Secundarista (CIRCUS), na quinta (30/11), às 15h.

Enquanto o dia não chega, confira a entrevista que ele deu ao site da UBES:

UBES: Depois da sua participação no CONEG, deu para perceber que você é muito querido pelos estudantes. A que se deve isso?

Bruno Ramos: Eu represento uma linguagem que fala diretamente com os jovens, que representa o que eles sentem e vivem. O funk é essa representatividade periférica. Fico emocionado em ver essa molecada com todo esse discurso de fortalecimento das políticas que são importantes para nós, enquanto filhos dos ricos não conseguem nem esquentar o próprio café. Ser querido por eles é sinal de que estamos muito próximos da mesma realidade, também sou de quebrada, da zona leste de Sampa, e fico lisonjeado com todo esse amor.

“Eu represento uma linguagem que fala diretamente com os jovens, que representa o que eles sentem e vivem.”

UBES: Os eventos da UBES são espaços de discussão política. De qual forma o funk e a política se misturam?

Bruno Ramos: Tudo o que acontece dentro do funk é uma expressão política, mas esse engajamento da Liga do Funk para disputar um espaço dentro da política é novo. Hoje nós temos uma proposta para além da formação artística. Agora, nós nos preocupamos também com a cidadania, em defender, entender, potencializar, educar e dar oportunidade para o jovem da comunidade, para que um dia o funk seja uma ferramenta de erradicação da pobreza.

UBES: Na prática, como o funk e a Liga contribuem com a educação?

Bruno Ramos: Nós acabamos de receber 20 jovens para conviver com toda a estrutura da Liga durante um mês, no curso de comunicação. O segundo edital que abriremos para essa convivência será de produção cultural e o terceiro, até dezembro, sobre formação artística e cidadania.

UBES: Forças conservadoras vêm tentando criminalizar o funk. Como a Liga tem encarado esses projetos?

Bruno Ramos: A criminalização parte principalmente da própria sociedade. A estratégia que nós estamos seguindo é a de ocupar os espaços de fala pelos veículos de mídia alternativos, para explicar, sem agressão, que o funk potencializa o jovem da periferia.

UBES: Criminalizar o funk também é criminalizar a juventude? Por quê?

Bruno Ramos: Criminalizar o funk é criminalizar o jovem preto, pobre e da periferia. Essa criminalização é anticonstitucional, já que o artigo 5º defende a liberdade de expressão, e nós temos o direito de falar o que pensamos. O que mais me incomoda é que novamente essa tentativa só parte dos conservadores, na tentativa de destruir um movimento que é de periferia, que surgiu numa forma de entretenimento e distração onde não existe lazer. Assim como aconteceu com o samba, com o hip hop e a capoeira, todos os movimentos negros no mundo sofrem perseguição.

“Assim como aconteceu com o samba, com o hip hop e a capoeira, todos os movimentos negros no mundo sofrem perseguição.”

UBES: Costumam dizer que os bailes funks, principalmente os realizados nas ruas, expõem os jovens à pedofilia, drogas, estupros, etc. O que você e a Liga pensam disso?

Bruno Ramos: A vulnerabilidade dos jovens nas ruas não é responsabilidade do movimento funk, pelo contrário, o movimento funk tem agregado possibilidades de ganhos justos e honestos para esses jovens que estão inseridos próximos ao mundo do crime. Pedofilia, drogas e estupros acontecem pela falta de políticas públicas dentro da comunidade e a fragilidade do Estado em cuidar das nossas crianças. É muito fácil empurrar essa sujeira para debaixo do nosso tapete, excluindo a responsabilidade do poder público. Se o Estado tivesse vontade de fortalecer a nossa cultura, criaria locais adequados para os adolescentes curtirem os bailes, com segurança, e a segurança que eu falo não é armada, é com a estrutura de banheiros químicos, acompanhamento de ambulâncias, eletricistas e espaços para os shows. O sistema foge dessa responsabilidade.

“Pedofilia, drogas e estupros acontecem pela falta de políticas públicas dentro da comunidade e a fragilidade do Estado em cuidar das nossas crianças. É muito fácil empurrar essa sujeira para debaixo do nosso tapete.”

UBES: Uma das críticas ao funk é ser um ritmo machista. Como vê essa questão?

Bruno Ramos: O funk é o reflexo do que a sociedade vive e pensa, se tem uma demanda procurando e consumindo esse estilo é porque a sociedade de fato gosta das letras. O que é colocado dentro das letras é uma outra discussão, é a questão da homofobia, do machismo…. Eu como funkeiro não me sinto confortável com isso, mas me sinto no papel, como liderança à frente da Liga do Funk, em conscientizar sobre os danos que algumas letras trazem para a sociedade.

UBES: Mas há espaço para o feminismo na liga do funk?

Bruno Ramos: A Liga do Funk é composta majoritariamente por mulheres e gays. A nossa diretora de mulheres, Andressa Oliveira, é preta, da quebrada, e curte muito funk. Ela, junto com a Débora Hellen, assumem o debate sobre feminismo e têm a paciência de nos explicar o que elas sofrem no dia a dia. Se elas não tentarem nos fazer entender e compartilhar da opressão a qual sofrem, eu, como homem, nunca vou entender, ou seja, elas são uma ponte para alguns caras que têm algum tipo de resistência e não conseguem compreender as mulheres, infelizmente. Eu sou um machista em processo de desconstrução, e quando eu falo que sou machista não é motivo de orgulho. O primeiro passo é reconhecer que nós somos, que a sociedade é machista, e buscar conhecimento para saber como podemos desconstruir. A periferia também é racista, é homofóbica, temos que ter cautela e nos responsabilizar diariamente para que isso não aconteça. Nomes como a Mc Cacau Rocha, Mc Carol de Niterói e Valeska tem mandado o papo reto contra o machismo.

“A periferia também é racista, é homofóbica, temos que ter cautela e nos responsabilizar diariamente para que isso não aconteça.”