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Mulheres negras: ausência de políticas públicas acentuam histórico de marginalização

Pesquisas atuais denunciam a vulnerável situação vivenciada pela população negra do sexo feminino no país. De acordo com o “Mapa da Violência 2015: Homicídio de Mulheres no Brasil”, ao longo de dez anos, o número de mulheres negras assassinadas sofreu um aumento de 54,2%. Foram 1.864 ocorrências em 2003 contra 2.875 casos registrados no ano de 2013. Enquanto isso, no mesmo período, o índice de homicídios de mulheres brancas decaiu 9,8%. Dados do Ministério da Justiça, referentes ao ano de 2015, revelam ainda que negras têm duas vezes mais chances de serem assassinadas se comparadas às mulheres brancas.

Diante desse quadro, no Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, comemorado em 25 de julho, um bloco composto por milhares de mulheres marchou pelas ruas de São Paulo com trajes e ritmos típicos da cultura nacional, oriunda da África. Símbolo de resistência da luta negra, um mar de turbantes coloriu a Praça Roosevelt, região central da cidade, no início da noite de segunda-feira (25).


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Em meio à luta por mais direitos, reconhecimento e representatividade, a militante do Movimento de Mulheres Negras da Uneafro Brasil, Débora Dias, 18, evidenciou as razões pelas quais resolveu integrar o ato. “Somos totalmente caladas e sofremos com a invisibilidade. Negras são mulheres que não têm direitos reconhecidos e nem espaço, e quando alcançam o lugar de fala, por muitas vezes, são desmerecidas, desacreditadas.”

Na pirâmide social, elas ocupam a base. Submetidas ao homem negro, à mulher branca e por fim, ao homem branco. Num breve histórico, é possível perceber que esse quadro não se trata de coincidência, mas do resultado de um processo histórico.

Após pouco mais de um século da abolição da escravatura, as feridas provocadas pelo desumano sistema que negligenciou, segregou e marginalizou negros seguem abertas, ecoando em forma de preconceito, violência, estereótipos e por meio da condição social a qual as afrodescendentes estão condenadas.

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Estereótipos: sexualidade da mulher negra

Fernanda Gonçalves, 19, estudante de Psicologia esteve na “Marcha das Mulheres Negras”. Nas palavras da jovem, “Nós somos objetificadas, violentadas sexualmente, exploradas no mercado de trabalho e até mesmo em nossas vidas afetivas. A mulher negra é a mulata gostosa do carnaval ou a empregada doméstica, nada mais! E é justamente o fim desses estereótipos que viemos buscar aqui, nós queremos respeito e igualdade. Desde o período escravocrata do Brasil, seguimos sendo o mínimo da sociedade, aquilo que não importa”.

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A história nacional diz muito sobre o imaginário coletivo atual, que representa as mulheres negras de forma sensual. A disseminação distorcida das relações entre colonizadores e escravas, feitas por meio de manifestações culturais e documentos, fortificou a construção de uma falsa realidade. Segundo registros históricos, índias e escravas que compunham a sociedade colonial – ainda que marginalizadas – consentiam relações sexuais e até mesmo tiravam proveito da situação, transformando-as em relacionamentos amorosos, afetuosos. Esses materiais distorcem a realidade e ilustram índias e escravas como mulheres que consentiam e até se beneficiavam da situação do abuso, da violação.

O discurso da advogada Maria Helena, 30, que integrou a marcha ao lado de amigas, denuncia os frutos do trágico processo histórico enfrentado pela população negra feminina. “Somos sexualizadas, olham para nós como se fossemos um objeto, isso é horrível! Você acaba não gostando do seu corpo porque tem alguém olhando para ele daquela forma nojenta! Ainda somos vistas como na época colonial: as mucamas que devem ser abusadas e servem apenas para trabalhar na faxina”.

Políticas Públicas

Os abismos criados por mais de 300 anos de um sistema escravocrata se tornam visíveis a partir dos números. Segundo estudo realizado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), no ano de 2011, 39,8% das mulheres negras brasileiras estavam em situação de pobreza. Nas favelas, 26% das casas são lideradas, mais uma vez, por elas: mulheres negras.

Nessa conjuntura, fica o questionamento: como consertar as desigualdades promovidas por mais de três séculos de escravidão?

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Mãe e assistente social, Carol Fonseca, 24, foi à marcha com a filha ao colo. Ela reafirma a necessidade de implementação de programas que se atentem ao quadro exclusivo vivido por mulheres negras nos dias de hoje. “Infelizmente nem mesmo as pesquisas para elaboração de políticas públicas fazem recorte de gênero e raça. Às vezes fazem corte de raça, mas ainda assim, são medidas que não pensam na mulher negra. Se existissem políticas que pensassem nesse grupo, que também compõe a sociedade, hoje não precisaríamos estar aqui gritando, pedindo atenção e lutando pelos nossos direitos”.

Logo após o fim da escravidão, no ano de 1888, os negros não foram integrados à sociedade de forma imediata. Ao contrário, ficaram desapropriados, abandonados após séculos de genocídio. Nesse sentido, ações por parte do poder público são essenciais para combater os reflexos das injustiças históricas por que passa a população negra de mulheres. Essas medidas possibilitam reparações históricas, promovem a reinserção, o reposicionamento de grupos que foram (e são) marginalizados, colaborando assim para a organização de uma sociedade mais inclusiva e democrática.

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Fora Temer!

A secundarista Nicole Miranda esteve na passeata e falou um pouco sobre o contexto político e social enfrentado pelo Brasil. Para ela, o governo interino de Michel Temer não representa a luta das mulheres negras, já que é composto, em sua maioria, por homens, brancos, ricos e cristãos.

Texto: Jéssica de Moraes | Imagens: Débora Neves