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Escola em TRANSformação: Estudantes trans contam os desafios

Escolas ainda estão em TRANSformação para se adaptar aos estudantes transexuais, transgêneros e travestis.

“É comum sofrer transfobia na escola.” 

A frase da estudante Dandara Pedrita de 19 anos reflete a realidade de muitas meninas e meninos trans em ambiente escolar. O lugar que deveria acolher a pluralidade das pessoas não está preparado para isso. 

A identidade de gênero e a orientação sexual ainda são tabus nas escolas que sofrem com falta de capacitação à comunidade escolar, gerando conflitos internos ainda maiores em estudantes trans. 

Dandara só se entendeu mulher trans por ter buscado estudar o assunto. Antes dos 16 anos, ela se achava um homem gay. Hoje, o sentimento dela é de libertação. “Durante muito tempo, fiquei num corpo que não era meu. Aí vim estudando e trabalhando minha autoaceitação. Isso tem tornado minha vida melhor”, diz a estudante.

Dandara atua no movimento secundarista e sempre está presente nas manifestações pela educação. (Foto: Danny Silva | Circus da UBES)

Segundo um levantamento de 2017 feito pela RedeTrans (Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil) com ONGs, 82% das mulheres trans e travestis abandonam o ensino médio entre os 14 e os 18 anos. A transfobia é o principal motivo. Para Dandara, resistência e luta por direitos é fundamental para superar esses problemas.

A estudante que cursa o 3° ano do ensino médio no Liceu Maranhense em São Luís (MA), já enfrentou transfobia em sala de aula em sua antiga escola. Quando estudava na Escola Modelo Benedito Leite, o professor de matemática se recusou a usar seu nome social. Ao ser questionado pela estudante, ele a colocou para fora da sala: “Ele queria me expulsar da escola. Aí eu gravei um vídeo e entrei com uma ação na Defensoria Pública”. 

O vídeo viralizou na capital do estado, os estudantes se uniram e conseguiram conversar com as Secretarias de Estado da Educação (Seduc) e de Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) que assinaram uma portaria que tornou obrigatório o uso do nome social de travestis e transexuais nos registros escolares.

 Estudantes reunidos com os secretários do Maranhão no dia da assinatura da portaria que assegurou o uso do nome social. (Foto: Lauro Vasconcelos)

“O nome social vem carregando a importância de respeito. Não basta só a gente se aceitar, sendo que a sociedade vem e nos discrimina”, diz Dandara que fez do movimento estudantil sua segunda família.

Detalhes que importam

Pequenos detalhes a um estudante cisgênero (que é aquele que se identifica com o gênero biológico) como ir ao banheiro ou responder a chamada são grandes desafios a serem enfrentados pelos jovens trans. Assim que se entendeu homem trans, Gael Elias Martins, de 16 anos, teve medo de contar para as pessoas sobre sua identidade de gênero e passar por constrangimentos provocados pelas outras pessoas. 

(Foto: Gael Elias Martins)

Gael sofre dificuldades para ir ao banheiro, afinal ele ainda usa o feminino. “Sempre vejo olhares diferentes para a minha presença”, diz o estudante do 2° anos do ensino médio da Escola Estadual de Ensino Profissional Marly Ferreira Martins em Caucaia (CE).

Já a estudante Mariah Morgado, de 17 anos, conta que não pode utilizar o banheiro feminino na Escola Futuro VIP no Rio de Janeiro (RJ), onde estuda o 3° ano. O argumento utilizado é que alguns pais de outros alunos “não entenderiam”. Como alternativa, disponibilizaram um banheiro exclusivo para a estudante: “Não acho o ideal, pois sou uma menina normal”.

(Foto: Mariah Morgado)

A Pesquisa Nacional sobre o Ambiente Educacional no Brasil, divulgada em 2017, diz que 73% dos estudantes que se declararam LGBTs foram agredidos verbalmente. Outros 36% relataram ter sido vítima de agressões físicas. 

Para Kátia Souto, especialista em saúde coletiva, a LGBTfobia afeta também a saúde mental da população LGBT. “A LGBTfobia mata e adoece. A saúde mental é uma das consequências desse processo. Viver numa sociedade que discrimina sua orientação sexual e identidade de gênero só pode adoecer, não apenas quem é discriminado, mas toda a sociedade”, afirma a especialista. Políticas públicas que fortaleçam o respeito pela diversidade são fundamentais para reparar esses danos, segundo Kátia.

O Grêmio Estudantil pode ser um grande aliado para combater a LGBTfobia na escola. Mariah dá sugestões para o grêmio ser ativo neste sentido: criar mecanismos para denunciar a transfobia, dar suporte aos estudantes e promover palestras a respeito do tema, por exemplo. “Tudo isso pode cooperar para que, no futuro, tenhamos mais pessoas trans nas escolas, nas universidades, nos melhores empregos e não mais nas ruas. Queremos inclusão”, ressalta a jovem.

Mariah se reuniu com os colegas em uma assembleia para criar o grêmio estudantil de sua escola. (Foto: Mariah Morgado)

Perguntada sobre seu futuro, Mariah diz que quer ser cientista social. “Quero estar realizada profissionalmente, conhecer cada cantinho desse Brasil e manter por perto todas as pessoas que eu amo e que me incentivam todos os dias a ser alguém melhor”, diz a estudante, que ainda completa: “Ser trans, estar viva e vivendo de forma pacífica em uma escola é resistência”.